Blog de Conjuntura – 2023

 

Equipe LACID: Cândido Grinsztejn; Gabriel Estill; Guilherme Barreiros; Maria Elena Rodriguez; Rafaela Mello; Renan Canellas

 

O ano de 2023 se iniciou com o retorno de Lula à presidência brasileira pela terceira vez. Durante seus dois primeiros mandatos (2003-2010), a relação bilateral com a China foi estreitada tanto em termos políticos e diplomáticos, como comerciais. O retorno de Lula à presidência brasileira remonta um cenário favorável ao aprofundamento das relações sino-brasileiras.

No âmbito político-diplomático, o estabelecimento da Comissão Sino-Brasileira de Alto Nível de Concertação e Cooperação (COSBAN) em 2004, assim como a fundação do bloco BRICS em 2009, representam marcos importantes na história da relação entre os dois países. Além disso, diálogos em foros multilaterais como na OMC e no G-20 também se apresentaram como oportunidades para os líderes políticos brasileiros e chineses estabelecerem parcerias estratégicas. A política externa de Lula (2003-2010), nesse sentido, buscou consolidar relações com países do Sul global e fortalecer a cooperação sul-sul.

Tais esforços também tiveram reflexos em termos comerciais. O boom das exportações de commodities brasileiras nos anos 2000 têm relação com o aumento da demanda chinesa que, à época, buscava diversificar seus parceiros comerciais. Isso fez com que o país asiático se tornasse o principal parceiro comercial brasileiro em 2009 e,  desde então, a China permaneceu em seu posto como maior destino de exportações brasileiras e como um país estrangeiro com um dos maiores estoques de investimentos no Brasil. Tal relação é estratégica para ambas nações, e o compromisso de mantê-la foi reforçado no início de 2023.

A presença do vice-presidente chinês Wang Qishan como líder da delegação chinesa na posse presidencial e a carta enviada por Xi Jinping  demonstram a importância da parceria sino-brasileira e é um aceno para seu aprofundamento durante o novo mandato. A carta além de colocar os dois países como parceiros estratégicos que compartilham interesses e assumem responsabilidades comuns de desenvolvimento, fala  sobre a intenção de ampliar a cooperação entre os países. Como resposta a Presidência da República agendou uma viagem à China para março, sendo a primeira  visita fora das Américas – visto que o presidente Lula esteve na Argentina para a cúpula da Comunidade dos Estados Latino-Americanos e Caribenhos (CELAC), emendando uma visita ao Uruguai, além da ida aos Estados Unidos também já acordada. Essa será a quarta ida de Lula à China como presidente do Brasil (2004, 2008 e 2009) e é uma oportunidade para o Brasil estreitar relações com seu principal parceiro comercial – sem perder o pragmatismo político, uma vez que uma viagem para os EUA também está programada.

Lula já declarou em diversas ocasiões o direcionamento de sua política externa ao retorno e fortalecimento do multilateralismo. Neste âmbito, o agrupamento BRICS – que reúne Brasil e China em um mesmo espaço de diálogo – pode ser considerado uma das frentes de ação para retomada do protagonismo brasileiro nas principais esferas multilaterais. Além disso, o Banco do BRICS poderá ser um importante instrumento para potencializar os investimentos e financiamentos em infraestrutura no Brasil.

O retorno do Brasil à CELAC representa o empenho de Lula em fortalecer os mecanismos de integração regional, que podem também demonstrar esforços em restabelecer canais de comunicação de maneira coletiva com a China, a partir do Fórum China-CELAC. Durante a Cúpula da CELAC em Buenos Aires, no dia 24 de janeiro de 2023, foi evidenciado o Plano de Ação 2022-2024 deste fórum – destacando a realização de reuniões especializadas nas áreas de transporte, desenvolvimento e redução da pobreza, tecnologia e inovação. Além disso, foi prevista a realização da Cúpula do Fórum China-CELAC em 2024 (DECLARAÇÃO DE BUENOS AIRES, 2023, p. 25).

Os direcionamentos tomados pelo novo governo brasileiro, em poucas semanas de gestão, indicam que o retorno de Lula à presidência abre novas perspectivas para a relação entre Brasil e China. Contudo, além da mudança de governo no Brasil, a relação bilateral com a China será influenciada pelo cenário global atual, que é bastante distinto daquele das administrações anteriores de Lula.

Questões atuais como a reabertura da China para o mundo após três anos da política de Covid-zero, a guerra russo-ucraniana, o acirramento das tensões entre China e Estados Unidos, o redirecionamento do desenvolvimento chinês visando um novo patamar de qualidade, a busca pela internalização da oferta de algumas commodities e a agenda do clima, terão grande impacto nessa relação (CHINA, 2021, p. 3-5; 55; 71; 78; 125).

Diante disso, surgem uma série de indagações: o que esperar do ritmo e do direcionamento setorial dos investimentos chineses no Brasil? Observaremos a retomada do esquecido Fundo Brasil-China? Como se comportarão as trocas comerciais bilaterais? O Brasil conseguirá em algum grau diversificar a sua pauta de exportações para o país asiático? O que a possibilidade de retorno do Brasil como fomentador da integração regional sul-americana significará para a China? O Brasil passará a integrar a Belt and Road Initiative?

Esses e outros questionamentos poderão apenas serem analisados e refletidos a partir das próximas ações não só do lado brasileiro, como também do lado chinês.  A visita do chefe do executivo brasileiro à China programada para março seguramente fornecerá importantes indícios de como a relação bilateral poderá evoluir. Nos resta observar com atenção os próximos passos deste novo momento das relações sino-brasileiras.

 

REFERÊNCIAS

 

CELAC. Declaración De Buenos Aires: VII Cumbre De Jefas Y Jefes De Estado Y De Gobierno De La Comunidad De Estados Latinoamericanos Y Caribeños (Celac). Buenos Aires, Argentina, 24 de janeiro de 2023. Disponível em: https://www.gov.br/mre/pt-br/arquivos/declaracion-de-buenos-aires-version-final.pdf

 

CHINA, República Popular. Outline of the People’s Republic of China 14th Five-Year Plan for National Economic and Social Development and Long-Range Objectives for 2035. Center For Security and Emerging Technology, 12 de maio de 2021. Disponível em: <https://cset.georgetown.edu/wp-content/uploads/t0284_14th_Five_Year_Plan_EN.pdf>