A China na agenda da sustentabilidade e a atuação das empresas chinesas

Autor: Rafaela Mello

Coordenação: Maria Elena Rodriguez

 

A agenda da sustentabilidade está presente nas mais diversas esferas político-econômicas atualmente. Tanto nas discussões internacionais sobre os impactos da mudança climática, quanto na atuação das empresas e sua governança corporativa e no setor financeiro, o desenvolvimento sustentável e a responsabilidade dos atores envolvidos estão sempre em debate.

 

Dado o seu posicionamento internacional, a China, como uma das principais economias no cenário vigente, deve compreender os desafios contemporâneos e atuar em conformidade com as demandas, demonstrando consideração sobre a questão da sustentabilidade, caso queira consolidar sua posição de liderança internacional.

 

Por um lado, as políticas e iniciativas chinesas, no nível governamental, sinalizam para um compromisso com as questões relacionadas à mudança climática. O engajamento do país asiático nas instituições e nos mecanismos da governança global indicam uma posição chinesa direcionada ao multilateralismo. Nesse sentido, as metas climáticas e os compromissos da China sinalizam para uma certa busca de cumprimento das metas estabelecidas pelo país asiático.

 

Com a implementação do 14º Plano Quinquenal da China, as metas climáticas do país asiático até 2025 são: (a) reduzir as emissões de CO2 em até 18% em relação à 2020; (b) reduzir o consumo de energia em 13,5% em relação ao mesmo ano; (c) expandir a cobertura florestal para 24,1%; e (d) aumentar a participação de combustíveis não fósseis na matriz energética para cerca de 20% (YI, 2021). Estas metas estão em consonância com a Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC, em inglês) da China, estabelecidas no Acordo de Paris.

 

Já em relação às metas climáticas reafirmadas na Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP26), a China se uniu aos Estados Unidos no anúncio que ambos iriam intensificar suas ambições climáticas e buscariam um compromisso em trabalhar juntos contra a liberação de carbono na atmosfera (DEWAN, NILSEN, 2021; G1, 2021). Porém, ao mesmo tempo, a posição chinesa, em conjunto com a Índia, pressionou pela “troca do termo ‘eliminação’ por ‘redução’ do consumo de carvão” no texto final da conferência (AMARAL, 2021), abrindo espaço para a continuidade do consumo de carvão nos próximos anos.

 

Nessa perspectiva, é possível compreender uma posição repleta de limites em que a China está localizada. Por um lado, o engajamento da China no movimento de transição para uma economia de baixo carbono e para o processo de transição energética merece destaque, com o desenvolvimento de tecnologias e investimentos neste setor, de modo que a China já responde pela maior adição anual de capacidade eólica e solar do mundo (YEP et al, 2021, tradução livre).

 

Por outro lado, a relevância do carvão para a economia chinesa é evidente, manifestada principalmente na composição de sua matriz energética. De modo que mais de 60% do fornecimento de energia é oriundo apenas do carvão (IEA, 2021). Dessa maneira, a China pode ser analisada como “ator central nas negociações e ao mesmo tempo, o maior emissor global dos gases. As emissões chinesas são em maior parcela advinda do setor de energia, que está baseado no carvão e no petróleo” (ESTEVO, 2020, p. 1).

 

Além disso, soma-se o fato da importância recaída sobre os aspectos ESG (Environmental, Social and Governance, em inglês) nos investimentos e no funcionamento das corporações atualmente. Esta sigla representa melhores práticas para que as organizações adotem princípios que norteiam não só a preservação dos recursos naturais, como também a redução das desigualdades sociais e uma governança livre de corrupção, discriminação e assédio.

 

Estes compromissos acabaram adentrando as esferas do mercado, tornando-se um dos direcionamentos para investidores e consumidores, aumentando a relevância destes aspectos tanto no setor financeiro, quanto na responsabilidade social das empresas (BETHÔNICO, 2021). Dessa forma, além dos compromissos no nível político-governamental, a China também deve considerar os aspectos da agenda da sustentabilidade em relação à inserção de suas empresas internacionalmente.

 

Tanto com a estratégia “Go Global”, quanto com a Belt and Road Initiative (BRI), a presença das empresas e dos investimentos chineses aumentaram em todo o mundo na última década (GIRADO, 2017, p. 25). Nesse sentido, torna-se relevante destacar o pensionamento destas empresas na agenda da sustentabilidade, a fim de compreender como ocorre a atuação destas organizações nos territórios ao redor do mundo.

 

Em pesquisa lançada recentemente pelo Business & Human Rights Resource Centre (2021), foram identificados “679 alegações de abusos de direitos humanos relacionadas à conduta empresarial chinesa no exterior”(RESOURCE CENTRE, 2021, p. 3, tradução livre). Dentre estas alegações, 236 estavam relacionadas ao setor de metais e mineração; 152 queixas ocorreram no setor de construção; e 118 alegações foram voltadas ao setor de energia fóssil. Além disso, é importante destacar que, apesar dos esforços chineses em alcançar seus compromissos climáticos, diversos investimentos voltados a energias renováveis também foram alvo de alegações, totalizando 87 queixas identificadas (RESOURCE CENTRE, 2021, p. 4). Desse modo,  mesmo que haja preocupação socioambiental no cumprimento das práticas ESG destas empresas, diversos casos problemáticos ainda são identificados.

 

Nesse sentido, é possível perceber os desafios e os limites do posicionamento da China na agenda da sustentabilidade, não só no âmbito político e governamental, como também no nível dos negócios e na atuação das empresas chinesas. Mesmo que haja conquistas em direção às metas climáticas, a China ainda enfrenta diversos limites que acabam gerando contradições. Se no discurso o país asiático apresenta cada vez mais compromissos climáticos, na prática os princípios ESG ainda precisam adentrar à governança de diversas organizações em busca de melhores resultados sustentáveis.

 

 

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Referências  Bibliográficas:

 

AMARAL, Ana Carolina. No fim da COP26, China e Índia ganham briga pela
continuidade do carvão. Folha de S. Paulo, 2021. Disponível em:
<https://www1.folha.uol.com.br/ambiente/2021/11/no-fim-da-cop26-china-e-india-
ganham-briga-pela-continuidade-do-carvao.shtml>.
BETHÔNICO, Thiago. Entenda o que é ESG e por que a sigla virou febre no mundo
dos negócios. Folha de S. Paulo, 2021. Disponível em:
<https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2021/06/entenda-o-que-e-esg-e-por-que-a-
sigla-virou-febre-no-mundo-dos-negocios.shtml>.
DEWAN, Angela; NILSEN, Ella. COP26: Promessa de cooperar com EUA
surpreende, mas China não muda metas climáticas. CNN Brasil, 2021. Disponível em:
<https://www.cnnbrasil.com.br/internacional/cop26-promessa-de-cooperar-com-eua-
surpreende-mas-china-nao-muda-metas-climaticas/>.
ESTEVO, Jefferson dos Santos. A China no âmbito da mudança climática. Negociações
exteriores e políticas domésticas. Desafíos, Bogotá (Colombia), (32-1), semestre I de
2020. Disponível em: <http://www.scielo.org.co/pdf/desa/v32n1/0124-4035-desa-32-
01-216.pdf>.
G1. COP26: China e EUA anunciam plano conjunto para corte de emissões de gases do
efeito estufa. 2021. Disponível em: <https://g1.globo.com/meio-ambiente/cop-
26/noticia/2021/11/10/cop26-china-e-eua-anunciam-plano-conjunto-para-corte-de-
emissoes.ghtml>.

GIRADO, Gustavo Alejandro. Las empresas chinas en América Latina. Colección de
Estudios Iberoamericanos (2015-2016), Universidad de Xuzhou/Social Sciences
Academic Press, 2017.
IEA. China, 2021. Disponível em: <https://www.iea.org/countries/china>.
RESOURCE CENTRE. "Going out" responsibly: The human rights impact of China's
global investments. 2021. Disponível em: <https://www.business-
humanrights.org/en/from-us/briefings/going-out-responsibly-the-human-rights-impact-
of-chinas-global-investments/>.
YEP, Eric; YIN, Ivy; ZHOU, Oceana. Energy transition strategic to China’s long-term
economic goals. S&P Global, 2021. Disponível em:
<https://www.spglobal.com/platts/en/market-insights/blogs/energy-transition/102821-
china-net-zero-carbon-emissions>.
YI, Shi. 14º Plano Quinquenal é confuso sobre trajetória climática da China. Diálogo
Chino, 2021. Disponível em: <https://dialogochino.net/pt-br/mudanca-climatica-e-
energia-pt-br/14o-plano-quinquenal-e-confuso-sobre-trajetoria-climatica-da-china/>.